sexta-feira, outubro 21, 2005

sobre os limpa pára-brisas...

...ou porque 5% dos condutores deixa as escovas em velocidade acelerada quando já não chove há uns bons minutos.
Venham os sensores automáticos para esta gente, ou ao fim de alguns anos o vidro já estará gasto e tão fino quanto uma casca de ovo...

quarta-feira, outubro 19, 2005

sobre o tempo que passa e não se dá por isso

Sobre a última data, 15 de Abril...
Debruço-me como me debrucei tantas vezes sobre tantas coisas, coisas tão importantes como a liberdade e coisas tão finas como a tangencial camada que é essa mesma liberdade que temos. Sobre a morte de um colega. Mais um... Faz agora algumas semanas. Alguém mais lembra? alguém para além de nós que labutamos nisto?
Passa o tempo, esquecemo-nos de tanta coisa... E outras, por mais que queiramos, não nos esquecem a nós - continuam a visitar-nos em sonhos e nos tempos mortos, até na solidão...
Volto aqui para me debruçar sobre o tempo, esse mesmo, que custa a passar, que por vezes passa sem se notar.
O tempo é tão importante como as beterrabas fritas em óleo com que se forra forra a cerâmica coberta com carne bem temperada e queijo e bechamel por cima.
Está tudo no peso e medida que nos apetece.
Hoje o mundo finda.
Amanhã renasce.
Mudamos o peso das coisas como podemos, queremos, quando nos lembramos.
A dor, essa, parece das poucas coisas que menos força temos para tirar do sítio...

segunda-feira, abril 18, 2005

sobre um mau dia

Como também poderia dizer sobre os desacertos.
Porque para um mau dia bastam eles, os desacertos; Como estarmos melancólicos e metade dos 'convidados' a entrarem-nos pelo táxi dentro germinarem electricidade, conversa fiada e aquela ponta de humor que nada tem a ver connosco...
Para um mau dia basta isso: estarmos off quando os restantes estão on.
Se ao menos para tudo houvesse um botão!

sexta-feira, abril 15, 2005

sobre as fotografias


Revejo por uma caixa de mail fotos de gente distante no tempo. Gente que já não via há alguns anos. Poucos. Mas alguns. Rostos que me foram diários. Familiares. Amigos. Colegas. Conhecidos. Até gente chata, muito chata. Ali estão eles todos. Fotos digitais de gente que conheci. Existem ainda. Estão vivos. Têm as suas vidas. Aqui me vêm parar sem pedir licença. E eu clico para vê-los a todos. Quem sabe porquê. Talvez para saber se estou muito mal em relação a eles. Talvez para me sentir melhor. Talvez apenas pela curiosidade que é tanto nossa, feminina. Talvez apenas para ver como a Filipa emagreceu. Como a Carla está mais bonita que nunca, naquele sorriso de mãe. Talvez para ver o João como sempre foi e, pelos vistos, sempre será. Talvez apenas para rever rostos e bustos e barrigas e seios e mãos e sorrisos e perceber como ao fim dos anos nós somos tanto nós como os que conhecemos, hoje como ontem.

terça-feira, março 15, 2005

sobre os sonhos

Como nenhum livro me pôde ajudar, peço aqui a resposta ou explicação lógica e racional para que alguém me diga o que significa sonhar com os dentes manchados de amarelo depois de ter comido caril dois dias antes...

segunda-feira, março 14, 2005

sobre os espelhos

gostaria de saber se mais mulheres há por aí que costumem dar um pulo ao CascaisShopping e, lá dentro, à loja Mango. É que ou muito me engano ou mudaram os espelhos nos provadores para nos fazerem sentir mais magras.
por muito boa vontade que tal possa ter significado, acho no fundo lamentável.

é que chegar a casa e ver que afinal a saia que comprámos não nos faz sentir assim tão magras, isso não é mau, é mesmo muito frustrante.

segunda-feira, fevereiro 21, 2005

sobre eles

ele para ele: Tens escrito muito?
ele: Bastante...
ele para ele: Algum romance?
ele: Não.
ele para ele: Novelas?
ele: Não.
ele para ele: Algum artigo de opinião? Críticas literárias?
ele: Também não...
ele para ele: Não? Então que é que tens escrito afinal? Alguma dissertação?
ele: Nada disso.
ele para ele: Então?
ele: post-its.

quinta-feira, fevereiro 10, 2005

sobre a contemplação

Pudesse eu todos os dias ser chamada a ir buscar alguém a 20 km de distância. Pudesse eu todos os dias sair da cidade com o rádio a sonorizar-me a vista do rio, da ponte, o frio gélido à distância impenetrável de dois milímetros de vidro. Pudesse eu prolongar esses minutos por horas, como se lá fora os minutos fossem meros minutos mas cá dentro corressem dias a fio do meu recolhimento.

Poderemos um dia dizer "não quero", "não posso", "só me apetece é...", e mais do que isso, mais do que dizer, passar do ponto morto à primeira mudança e arrancar na direcção oposta que todos tomam em graves velocidades?

Pudesse eu todos os dias contemplar livremente sem a pressão de um fim anunciado. Mas e daí, quem sabe, talvez nós, seres humanos deste tempo, sem o prenúncio do fim nunca verdadeiramente daremos valor à contemplação...

sexta-feira, fevereiro 04, 2005

Sobre a amizade esfaqueante

Entram duas amigas, simples indicação directa e sem cumprimento – "Era para as Amoreiras".
Fico calada. Já percebi o meu lugar aqui entre estas duas. Uma delas logo arranca a conversa:
-Sinto-me tão cansada, hoje!
-A sério?
-Sim... Já tomei um chá preto e tudo. Mas sinto-me... sei lá.
-É. Por acaso agora que dizes isso, de facto não estás assim com boa cara, não...
-A sério? Ai, não acredito!
-Não é nada de mais... é só um bocadito de olheiras...
-Ó pá, mas eu até tenho dormido tanto!
-Pois, não sei...
-Mas achas que estou assim tão mal!?
-Não, não é nada de mais...
-Mas estou pálida? Achas que preciso de ir ao solário?
-Não, não é bem isso...
-Então?
-Realmente estás assim com uma corzita meio...
-Meio quê?
-Não sei bem... tipo...
-Uma cor tipo quê?
-Tipo bílis. Percebes?

terça-feira, janeiro 25, 2005

sobre uma lenda transformada em artigo de feira


Sabemos que o mundo se tornou um lugar estranho quando vemos um comerciante usar um gorro tamanho XL, preto, de feira, e a descambar da cabeça, com as palavras escritas na frente e a dourado “The Doors”.
Não se faz.
Simplesmente não se faz...


sexta-feira, janeiro 21, 2005

sobre a sinceridade

Ela esguia, algo feiíta, cabelo muito liso e fino, olhos grandes, azuis cinza, lindos, tristes contudo.

-Desculpe... não quero que me leve a mal...
-Diga.
-Às vezes, aqui assim no táxi, não se sente sozinha?
-Às vezes... como toda a gente. Porque é que pergunta?
-Porque acho que as pessoas que mais vivem rodeadas de muita gente são quase sempre as que se sentem mais sozinhas.
-Às vezes, sim... (pausa) A senhora também?
-Também...
-Sem me querer intrometer demasiado; o que é que a senhora faz?
-Sou caixa.
-Num supermercado?
-Não, num Banco.
-Ah... Talvez por isso...
-Por quê?
-Porque é assim mesmo. Connosco as pessoas chegam e logo vão. E não se pode dizer que estejamos rodeadas de pessoas; estamos todo o dia sozinhas. Temos é imensas visitas, se é que me percebe...
-Sim, mas acho que também percebeu o que eu quis dizer.
-Claro que sim.
Pauso.
Percebo que há ali alguém que não teve um dia muito feliz.
Reponho a conversa:
-Às vezes não deseja ardentemente que alguém, nem que seja apenas uma pessoa, lhe pergunte com sinceridade "Como está?", em vez de ser apenas uma muleta para iniciar conversa?
-Quer que eu lhe diga uma coisa com toda a sinceridade?
-...
-Não. Já tive esse desejo. Mas hoje não acho que seja realmente tão importante assim. Sempre aparece uma ou outra pessoa que nos conhece já de há algum tempo e nos pergunta, de facto, com autenticidade, como estamos. Mas o que eu queria dizer realmente no início, quando lhe perguntei aquilo, é se não sente falta de um homem com quem ir para a cama.


terça-feira, janeiro 18, 2005

sobre as armas

por vezes gostava de cessar toda esta farsa, limpar esta nublina, puxar o véu para o lado. Pensarão talvez que falo do anonimato, mas não. Falo de nós. Sobre nós. Sobre como tantos de nós é assim mesmo. Ausente. Distante. Só. Mas cheia de amigos. Cheia de gente. Cheia. Acompanhada. Junto. Tal como tantos que passam pelo meu táxi. Ali estamos nós. Dois seres do mesmo mundo. E contudo nunca estivémos tão distantes. Somos rostos falsos. Porque falamos e não vemos, de facto, que rugas e que lágrimas e que risadas há em cada um.

sobre isto, por vezes, gosto de dizer que é assim, e é assim mesmo.

irei eu, alguma vez, conhecer mais de alguém pelo que lhe leio, mais do que poderia se me dessem três instantes do rosto de cada um, a dormir, na cama, isento de armas de defesa!?

não creio.

sobre as palavras

Quantas palavras temos nós de ler por cada uma que escrevemos?
E quantas palavras temos nós de ler por cada uma boa palavra que escrevemos?

sexta-feira, janeiro 14, 2005

sobre a poesia da fotografia

Em casa de uma amiga minha desfolho um livro com uma série de fotografias que já andaram em exposição itinerante pelo mundo fora. A dada altura, detida e entretida a ver uma delas, viro uma página, observo uma foto e partilho-a, mostrando-a:
-Já viste este auto-retrato?
Ela olha a foto e depois olha para mim. Olha de novo a foto e depois olha de novo para mim. Quase a sorrir, pergunta-me:
-Já leste o título da foto?

Intrigada, baixo o rosto e reparo nas letrinhas pequeninas, onde leio:
"Fotografia de um espelho"

quarta-feira, janeiro 12, 2005

sobre o silêncio

Talvez se esta cidade se apinhasse de silêncio, talvez se uma entidade superior me desse um telecomando mágico e eu carregasse na tecla de 'mute', talvez se eu fosse Deus e pusesse o indicador erguido à frente dos lábios fechados e apertados e assim toda a gente me obedecesse (ou pelo menos os cristãos, que já não era pouco), talvez se alguém tirasse o cabo que liga esta barulheira toda às colunas que ainda amplificam tudo mais e mais... talvez assim, quem sabe, o raio desta dor de cabeça se pusesse a andar daqui para fora e eu pudesse aturar melhor as filas de trânsito e as buzinadelas parvas, já para não falar nas bocas parolas de quem parece que nunca viu uma mulher ao volante.

sexta-feira, janeiro 07, 2005

sobre o frio

Já criaram o aquecimento geral, os desembaciadores para os vidros e até aquecimento nos bancos... Mas quando é que se lembram de criar um aquecimento interno nos volantes? Uma pessoa fica com as mãos geladas! Não há cremes que nos salvem!

quinta-feira, janeiro 06, 2005

sobre peep-shows e casas de meninas

Noite. Ainda é cedo. Braço levantado. Páro. Ele, um tipo comum, nada de mais, até bem arranjado, cinquentão, entra e senta-se com toda a calma.

-Leve-me ao passerelle, por favor...

Uns vinte ou trinta segundos a olhar lá para fora.

-Já sei o que deve estar a pensar: "Olha-me mais um tarado!". Mas se lhe disser porque é que vou a alguns destes sítios, se calhar não acredita. O propósito é puramente cómico! Como é mulher, acredito que não saiba destas coisas... quer dizer... não estou a dizer que não sabe o que lá se passa, só estou a dizer é que provavelmente não sabe destas graças que lhe ia contar. (ri-se) Sabe, é que eu vou lá porque às vezes o desleixe nos dá vontade de rir. É claro que é tudo sobre mulheres. Mas se às vezes visse!... (ri-se de novo) Eu vou lá porque é engraçadíssimo! Às vezes há umas que andaram a rapar-se há minutos atrás e ainda estão com a pele toda irritada, uma ou outra esqueceu-se de tirar um penso rápido, outra tem o azar de naquele dia ter uma borbulha enorme num sítio prioibitivo... (ri-se a bandeiras despregadas, como se estivesse a falar do Buster Keaton) Enfim, às vezes só me dá mesmo vontade de rir! Ai, ai...

O mais curioso nisto é que, acreditem, eu nem lhe perguntei coisa nenhuma...