sexta-feira, janeiro 21, 2005

sobre a sinceridade

Ela esguia, algo feiíta, cabelo muito liso e fino, olhos grandes, azuis cinza, lindos, tristes contudo.

-Desculpe... não quero que me leve a mal...
-Diga.
-Às vezes, aqui assim no táxi, não se sente sozinha?
-Às vezes... como toda a gente. Porque é que pergunta?
-Porque acho que as pessoas que mais vivem rodeadas de muita gente são quase sempre as que se sentem mais sozinhas.
-Às vezes, sim... (pausa) A senhora também?
-Também...
-Sem me querer intrometer demasiado; o que é que a senhora faz?
-Sou caixa.
-Num supermercado?
-Não, num Banco.
-Ah... Talvez por isso...
-Por quê?
-Porque é assim mesmo. Connosco as pessoas chegam e logo vão. E não se pode dizer que estejamos rodeadas de pessoas; estamos todo o dia sozinhas. Temos é imensas visitas, se é que me percebe...
-Sim, mas acho que também percebeu o que eu quis dizer.
-Claro que sim.
Pauso.
Percebo que há ali alguém que não teve um dia muito feliz.
Reponho a conversa:
-Às vezes não deseja ardentemente que alguém, nem que seja apenas uma pessoa, lhe pergunte com sinceridade "Como está?", em vez de ser apenas uma muleta para iniciar conversa?
-Quer que eu lhe diga uma coisa com toda a sinceridade?
-...
-Não. Já tive esse desejo. Mas hoje não acho que seja realmente tão importante assim. Sempre aparece uma ou outra pessoa que nos conhece já de há algum tempo e nos pergunta, de facto, com autenticidade, como estamos. Mas o que eu queria dizer realmente no início, quando lhe perguntei aquilo, é se não sente falta de um homem com quem ir para a cama.


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